O governo federal tem enfrentado críticas contundentes em relação aos seus altos gastos públicos e a aparente falta de interesse na implementação de uma reforma administrativa que possa direcionar o país para uma trajetória fiscal mais sólida. Enquanto o governo estabeleceu a ambiciosa meta de zerar o déficit primário da União até 2024, as projeções apontam para uma realização extremamente desafiadora, uma vez que a obtenção de receitas adicionais de R$ 168,5 bilhões se mostra quase inalcançável.
Uma das principais fontes dos problemas das contas públicas do Brasil reside nos elevados e inflexíveis gastos públicos, caracterizados por despesas de baixa eficiência e que pouco contribuem para o crescimento econômico sustentável do país. Entre essas despesas, as relacionadas ao funcionalismo público destacam-se como uma questão premente. De acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), União, Estados e municípios despendem cerca de 12% do Produto Interno Bruto (PIB) com o funcionalismo, um percentual significativamente superior à média de 8% a 9% observada em países emergentes e latino-americanos.
A necessidade de uma reforma administrativa que contemple a redução dos gastos com o funcionalismo em relação ao PIB torna-se inegável. Essa reforma deve concentrar-se na modernização do serviço público e na definição de critérios rigorosos para a avaliação dos servidores. Contudo, até o momento, a iniciativa do governo nessa área tem sido modesta, e o atual arcabouço fiscal não parece ter sido concebido para lidar com o problema do crescimento das despesas, mas, pelo contrário, para garantir sua expansão constante acima da inflação.
A ideia de impulsionar o crescimento econômico por meio do gasto estatal é questionável. É essencial compreender que o Estado retira recursos da economia antes de poder gastá-los, transferindo dinheiro de uns para outros, sem gerar riqueza líquida. Portanto, buscar aumentar a prosperidade geral por meio do gasto público é comparável a tentar elevar o nível de água em uma piscina despejando-a de um lado para o outro. É uma estratégia ineficaz que, em última instância, prejudica o desenvolvimento econômico.
Diante dessa situação preocupante, é fundamental que o governo inicie cortes significativos nos ministérios e cargos comissionados. Atualmente, o Brasil conta com quase 40 ministérios e aproximadamente 30 mil cargos e funções de confiança em diferentes escalões do governo, sem mencionar os comissionados em empresas estatais, fundações e agências reguladoras. Essa máquina administrativa gigantesca, além de onerosa, é incompatível com a realidade econômica do país.
É preciso adotar uma abordagem de longo prazo e focada na reforma administrativa. Isso implica na redistribuição eficaz dos servidores entre os órgãos públicos, reduzindo gradualmente a necessidade de novas contratações de comissionados e promovendo maior eficiência na gestão pública.
Após dez meses de governo, a reforma na administração pública se apresenta como uma lição de casa urgente e inadiável. Caso o governo não aborde seriamente essa questão, o Brasil continuará a enfrentar desafios financeiros crescentes, colocando em risco o futuro econômico do país. É hora de agir com determinação e responsabilidade, priorizando o interesse público sobre as demandas políticas e partidárias. Somente assim o Brasil poderá construir uma base sólida para o crescimento e o desenvolvimento sustentável.
Por Murillo Torelli, professor de Contabilidade Financeira e Tributária no Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).