A proposta de implementar a tarifa zero nos ônibus em São Paulo, desejada pelo prefeito Ricardo Nunes e confrontada pelo governador Tarcísio de Freitas, desencadeia um debate sobre os impactos econômicos dessa medida. A gratuidade tem um potencial trunfo eleitoral e uma forma de marcar uma gestão municipal ainda pouco reconhecida, mas sem avaliar os riscos financeiros e a inviabilidade econômica da proposta.
O sistema de transporte público em São Paulo é um complexo entrelaçamento entre os ônibus, de responsabilidade municipal, e o metrô/CPTM, geridos pelo governo estadual. Ambos compartilham uma tarifa única de R$ 4,40, congelada desde 2020 devido à pandemia da Covid-19. Esse congelamento, no entanto, já tem sobrecarregado os cofres públicos, que subsidiam as empresas para manter o valor da passagem.
O governador Tarcísio de Freitas propõe um reajuste para R$ 5,50, justificando que a manutenção da tarifa atual coloca em risco a solvência do Metrô e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Enquanto isso, o prefeito Ricardo Nunes sinaliza a possibilidade de adotar a tarifa zero (para os ônibus), começando com experimentos, principalmente aos domingos ou períodos noturnos, mas podendo se expandir para todos os dias.
A proposta, embora atraente do ponto de vista popular, apresenta riscos econômicos substanciais. Primeiramente, a gratuidade não gera receitas diretas, o que pode levar a uma redução nos investimentos e na qualidade do serviço oferecido. Sem uma fonte de recursos sólida, o sistema de transporte público pode sofrer com a falta de manutenção, renovação da frota e melhorias estruturais.
Além disso, a tarifa zero cria um desafio em relação aos “bens comuns a todas e todos”, pois, ao eliminar o custo direto para os usuários, a população acaba não contribuindo financeiramente para a manutenção do serviço. Isso pode resultar em uma situação em que poucos desfrutam do transporte público subsidiado por muitos, exacerbando desigualdades e criando um ônus para os cofres públicos. Quem sustenta os cofres são os contribuintes do município, que vão compensar essa “gratuidade” dos ônibus de outras formas, com majoração no IPTU, ISSQN e outras taxas municipais, por exemplo.
A discussão sobre a tarifa zero nos ônibus em São Paulo vai além de uma questão meramente política. Os riscos econômicos envolvidos demandam uma análise cuidadosa sobre como equilibrar a acessibilidade ao transporte público com a sustentabilidade financeira do sistema. É crucial encontrar soluções inovadoras que garantam a eficiência do serviço sem comprometer a estabilidade econômica. A implementação de medidas como a tarifa zero deve ser cuidadosamente ponderada, considerando seus impactos a longo prazo e a necessidade de promover investimentos e criação de valor para toda a sociedade.
Murillo Torelli é professor de Contabilidade Financeira e Tributária no Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).