O banco Santander divulgou uma análise que questiona fortemente os ganhos econômicos das apostas esportivas no Brasil, tema que tem ganhado destaque com a crescente popularização das plataformas de betting no país. Em um relatório recente, o banco afirmou que a arrecadação tributária proveniente das apostas dificilmente será suficiente para cobrir os altos custos sociais e de saúde gerados pelo vício e suas consequências. O documento coloca as apostas em uma posição de prejuízo líquido para a sociedade, enfatizando que, embora o setor possa gerar receita para o governo, esses valores não superariam os gastos com o tratamento e prevenção de transtornos relacionados ao vício.
O alerta vem em um momento em que o governo brasileiro discute como regulamentar o setor de apostas, após anos de crescimento descontrolado. Desde a legalização parcial em 2018, as apostas esportivas se tornaram um mercado lucrativo, com centenas de milhões de reais movimentados anualmente. O governo estima arrecadar bilhões em impostos com a nova regulamentação, mas, de acordo com o Santander, esse potencial pode ser ilusório.
Custos sociais superam arrecadação tributária, aponta Santander
Para o Santander, o cálculo do impacto financeiro das apostas não deve se limitar ao valor das arrecadações fiscais. O relatório aponta que o vício em jogos de aposta representa um risco significativo para a saúde mental e o bem-estar dos jogadores, resultando em despesas adicionais no sistema de saúde pública. Os custos com atendimentos psiquiátricos, tratamentos de dependência e programas de reabilitação podem superar consideravelmente a receita obtida através dos impostos sobre as apostas, diz o banco.
Esse impacto social já foi observado em outros países que regularizaram o setor, como o Reino Unido e os Estados Unidos. Nesses locais, a relação entre receitas e despesas foi desequilibrada, e o aumento de vícios em jogos trouxe à tona problemas graves como o endividamento de famílias, aumento da taxa de suicídio entre jogadores compulsivos e pressão adicional sobre os serviços de saúde pública. A experiência internacional, portanto, serve de exemplo do potencial de desestabilização social, algo que o Santander considera inevitável no Brasil.
Casas de apostas: bomba-relógio para a saúde pública?
O vício em apostas é amplamente reconhecido por especialistas como um problema de saúde mental sério e muitas vezes subestimado. A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica a dependência em jogos de azar como um transtorno que pode levar a consequências como depressão, ansiedade e outros problemas psiquiátricos. Segundo o Santander, esses transtornos gerados pelo vício representam um dos maiores riscos para o sistema de saúde pública no contexto das apostas esportivas.
No Brasil, a falta de infraestrutura adequada para lidar com transtornos psiquiátricos agrava ainda mais o cenário. Com o aumento da demanda por tratamento de vícios em jogos de aposta, o sistema de saúde pública, já sobrecarregado, pode enfrentar um colapso. O banco alerta que a demanda por serviços de saúde mental deve crescer exponencialmente, principalmente entre jovens, um dos grupos mais vulneráveis ao marketing agressivo das plataformas de apostas.
Modelo tributário pode ser insuficiente para cobrir custos, afirma Santander
Além das questões de saúde pública, o Santander questiona a eficácia do modelo tributário proposto para o setor de apostas. A análise do banco considera que, embora as previsões de arrecadação sejam altas, o montante estimado pode ser muito otimista. A realidade, de acordo com o relatório, é que as operadoras de apostas, especialmente aquelas que operam internacionalmente, podem buscar formas de evitar o pagamento integral dos tributos brasileiros, reduzindo a expectativa de arrecadação.
As plataformas de apostas, muitas vezes baseadas em paraísos fiscais, possuem complexos modelos de operação e contabilidade que podem dificultar a fiscalização. Com isso, a arrecadação esperada pode ser aquém do estimado, ampliando o déficit entre receitas e os custos associados aos problemas sociais gerados. O banco também aponta que a entrada de operadores no mercado brasileiro pode ser inibida pela carga tributária e pelas obrigações regulatórias, reduzindo ainda mais o potencial de arrecadação.
Diante desses desafios, o relatório defende uma abordagem mais cautelosa do governo brasileiro em relação à regulamentação das apostas esportivas. O banco sugere que, em vez de priorizar a arrecadação imediata, o governo invista em campanhas de conscientização, programas de prevenção e suporte a quem já se encontra em situação de dependência. Segundo o relatório, essa estratégia não só reduziria o impacto negativo sobre a saúde pública como também promoveria um ambiente mais sustentável para o setor.
Em última análise, o banco argumenta que, para evitar uma crise de saúde pública, a regulamentação deve incluir limites mais rígidos para publicidade de apostas, especialmente aquelas que se dirigem a públicos vulneráveis, como jovens e pessoas em situação financeira instável. Além disso, o governo poderia implementar um sistema de controle de perdas e limites de gastos, que funcionariam como barreiras para evitar o endividamento compulsivo dos jogadores.
Em tempo
O Ministério da Fazenda estabeleceu que todas as empresas de apostas esportivas online devem se regularizar até o final de 2024 para continuar operando no Brasil. A medida, divulgada em 29 de outubro de 2023, faz parte do esforço para regulamentar o setor, que movimenta bilhões de reais anualmente e representa uma importante fonte de arrecadação fiscal. A regulamentação exigirá que as empresas obtenham licenciamento específico e cumpram com normas tributárias e de operação, alinhando o Brasil a padrões internacionais de controle do setor.
Segundo a nova orientação, as apostas esportivas deverão ser tributadas em 18%, de acordo com as regras aprovadas na Medida Provisória nº 1.182/23, sancionada pelo presidente Lula em julho de 2023. A medida prevê que a arrecadação dessa tributação contribua para o aumento das receitas fiscais e a formalização de um setor que, até então, operava de forma descentralizada e sem fiscalização rigorosa.