- Argentina registrou primeiro superávit trimestral e teve queda na inflação
- Quando Milei assumiu a presidência, a inflação anual estava acima de 200%
- No entanto, a tendência está diminuindo, marcando a quarta queda consecutiva, com 8,8% em abril, comparado a 11% em março
- Segundo alguns analistas, o “tratamento de choque” proposto por Milei está direcionando o país para o controle econômico
Quando Javier Milei assumiu a presidência da Argentina em dezembro de 2023, a inflação anual estava acima de 200%. Em novembro, os preços haviam subido mais de 160%.
Em abril, a inflação acumulada atingiu 289,4%. No entanto, a tendência está diminuindo, marcando a quarta queda consecutiva, com 8,8% em abril, comparado a 11% em março.
Segundo analistas consultados pela CNN Brasil, o “tratamento de choque” proposto por Milei durante sua campanha está direcionando o país para o controle econômico.
“O governo Milei entendeu que a Argentina estava em uma situação macroeconômica muito complicada”, afirma Camilo Tiscornia, professor de macroeconomia na Argentina.
“Por trás do grande problema de inflação da Argentina está o permanente déficit fiscal. Então, eliminá-lo, como está fazendo o governo atual, é um passo na direção correta”, complementa.
“A chave que precisaram girar”, ou o “registro que precisaram fechar”, foi o gasto público.
Na posse, o governo argentino enfrentava um déficit primário de quase 3% do PIB. O tratamento de choque começou de imediato, com o “decretaço” de Milei, que incluiu cortes de investimentos na indústria e no comércio, a revogação de leis ambientais e políticas para facilitar a privatização de estatais.
Além disso, foram anunciados cortes nos subsídios para gás, eletricidade, combustíveis e transportes públicos. Em março, o resultado foi evidente: o governo argentino registrou seu primeiro superávit trimestral desde 2008, acumulando 275 bilhões de pesos em caixa.
“A inflação caiu porque o gasto público caiu. A gente tem uma redução tremenda no gasto, ou seja, a demanda do estado hoje é muito menor”, comentou Mauro Rochlin, economista e professor da FGV.
“Acho que o país caminha na direção certa uma vez que a gente tem uma redução muito acentuada da inflação”, ele completou.
A atividade econômica no país, no entanto, está em declínio. Em março, houve uma queda de 8,4% em relação a fevereiro, marcando o quinto mês consecutivo de retração.
Medidas de controle
Camilo explica que esperavam esse movimento, pois as medidas iniciais de Milei para controlar a inflação desacelerariam a economia. No entanto, ele destaca que para reativar a economia e permitir a circulação de crédito, “o caminho é o superávit”.
O analista Jefferson Laatus, destaca especialmente as medidas do governo relacionadas ao câmbio. Em dezembro, anunciaram uma desvalorização de quase 50% do peso em relação ao dólar.
Milei prometeu eliminar as distorções e os preços artificiais na economia, incluindo o câmbio, que o governo controlava. Após a desvalorização abrupta, as cotações, portanto, começaram a mostrar alguma estabilidade, contribuindo para o controle da inflação.
“Ainda tem muito o que ser feito para poder recuperar a economia argentina, mas isso começa a dar bons olhos para o mundo”, comentou Jefferson, estrategista-chefe da consultoria Laatus.
“O processo [de controle da inflação] é tido como positivo e vem colocando novamente a Argentina como um possível futuro investimento pros grandes investidores”, explica.
Desde a posse de Milei, o índice S&P Merval, referência da bolsa de valores da Argentina, disparou mais de 70%, atingindo 1.659.247,63 pontos na última segunda-feira (3).
“Todos os bancos internacionais e, principalmente, os grandes capitais internos na Argentina, apoiam ruidosamente essa proposta de Milei. Ela é aplaudida pelos bancos externos porque eles veem um movimento que vai lhes garantir o pagamento dos valores já emprestados”, complementa Leonardo Trevisan, professor de relações internacionais da ESPM.
Em fevereiro, o Fundo Monetário Internacional (FMI) descreveu o plano de estabilização de Milei para a economia argentina como “ousado” e “muito mais ambicioso” do que os dos governos anteriores.
No entanto, economistas alertam que, apesar dos sinais de melhora, a situação ainda exige cautela quanto à sustentabilidade dessas medidas.
“A forte apropriação por parte das autoridades e o compromisso eleitoral para eliminar os déficits fiscais e os impedimentos de longa data ao crescimento (muitos deles beneficiando interesses particulares) atenuam os riscos de implementação”, apontou o Fundo em um relatório técnico sobre a Argentina.
“A dúvida hoje é se esse choque fiscal vai se manter, uma vez que o impacto social é muito grande.”
A reforma e a contribuição para a redução da inflação
O economista da FGV observa que a reforma não apenas contribui para a redução da inflação, mas também aumenta as tensões sociais.
Segundo o Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (INDEC) argentino, 41,7% da população do país estava em situação de pobreza no final de 2023.
Um relatório da Universidade Católica da Argentina indica que o nível de pobreza atingiu 57,4% em janeiro, o mais alto em pelo menos 20 anos.
Portanto, Trevisan destaca que “os críticos da reforma são aqueles que estão suportando o ônus deste aumento”.
Apesar de alguns indicadores econômicos favoráveis, o economista Roberto Luis Troster enfatiza que “os próximos passos incluem definições para além da mera adaptação do mercado”.
“Ele vem fazendo um bom trabalho, mas tem que pensar o que vai fazer para a educação, que é a base do crescimento de um país. O que vai fazer para a saúde?”, complementa o economista.