Apesar de tentar lidar com as pressões de preços que estão ocorrendo e controlar a inflação por meio da política de aumento acelerado da taxa de juros, o Banco Central não obteve êxito e já tem 2022 como um ano perdido nesse sentido.
Para André Roncaglia, professor de Ciências Econômicas da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios da Universidade Federal de São Paulo (EPPEN / Unifesp), “apesar de o Banco Central fazer aquilo que está dentro do mandato dele, subindo a taxa de juros para patamares muito elevados, de maneira até excessivamente acelerada, essas pressões de preço não puderam ser controladas e nem poderiam ser porque foram causadas por fatores imunes à taxa de juros”.
Roncaglia explica que a inflação de 2022 resultou de uma combinação absolutamente inesperada no sentido de choques diversos que aconteceram no plano das cadeias de suprimento internacional associado à crise na Ucrânia, “que veio acelerar o preço de commodities em várias categorias, lembrando que tanto a Ucrânia quanto a Rússia são grandes exportadoras de commodities, e isso pegou em cheio a economia brasileira”.
“Foi uma sequência de choques inevitáveis, difíceis de antecipar extensão, alcance e profundidade e, nesse sentido, dizer que o Banco Central perdeu o controle implica aceitar a premissa de que ele tinha esse controle, o que não é verdade”, avalia o docente da Unifesp.
Diante do cenário, o Banco Central subiu rapidamente a taxa de juros para comprimir a expansão de preços nos setores que não eram afetados diretamente por esses choques de oferta de combustível, energia elétrica e commodities, principalmente o setor de serviços, para que eles pudessem acomodar ou segurar a elevação da inflação, “fazendo com que a economia brasileira andasse de lado, possivelmente crescendo 0,5% ou possivelmente com crescimento zero neste ano”, diz Roncaglia.
Setores de serviço, varejo e construção, que previam franco crescimento, já estão sinalizando que isso não aconteceu, por efeito da política de juros, o que reforça a visão do Banco Central de que 2022 não é mais horizonte relevante para se atingir a meta de inflação.
De acordo com o professor, “desde o início deste ano o BC está efetivamente focando no final de 2023 e está fazendo isso colocando a taxa de juros muito provavelmente ao elevado índice de 12,75%, tentando sinalizar que não perdeu o controle. Ao contrário, ele só teve que estender o prazo de convergência à meta por conta desses choques que são absolutamente insensíveis ao comportamento da taxa Selic. Ela não controla preço de commodities, assim como não influencia o preço internacional do petróleo”.
Na contramão, avalia Roncaglia, “o que temos é um conjunto de valores afetados diretamente por preços internacionais e um indicador do que podemos chamar de positivo da política de taxa de juros do Banco Central é a apreciação cambial em meio a essa crise, em que se imaginaria que o câmbio fosse desvalorizar e ele na verdade está se apreciando. Esse efeito de apreciação cambial acaba tendo um efeito moderador sobre o comportamento de preços internos da economia porque ele incide sobre o preço dos bens importados”.
Assim como aconteceu em 2021, quando o Banco Central objetivava inflação de 3,75% e terminou o ano com mais de 10%, a meta de 3,5% para 2022 já não é mais uma realidade e trabalha-se agora com a perspectiva de uma inflação superior a 6%.